22.10.24

Santa Catarina

 

Os eventos políticos que se sucederam em Portugal e no Brasil e culminaram com a independência repercutiram em Santa Catarina de maneira geral em conformidade com as orientações dirigidas pelo Rio de Janeiro, seja pelo rei Dom João, seja pelo príncipe Dom Pedro. Tal vínculo advinha da função estratégica que a Ilha de Santa Catarina desempenhou na segunda metade do século XVIII e no começo do XIX. Desterro era considerada o posto avançado do Rio de Janeiro no Rio da Prata. Calcula-se que na época da independência a província tinha cerca de 45 mil habitantes; destes, 25% eram escravizados; já a população livre convivia com constantes recrutamentos para o exército e confisco da produção agrícola para o abastecimento das tropas.

Não há registro de revoltas ou contestação política em Santa Catarina nos moldes do que ocorreu em outras províncias, o que marcou a peculiaridade da independência nesta província. Não que não pudesse acontecer: como porto marítimo, as ideias circulavam pelos viajantes que ali aportavam.

Em 25 de abril de 1821, o governador João Vieira Tovar e Albuquerque jurou as bases da Constituição, após saber que Dom João havia feito o mesmo no Rio de Janeiro. A notícia de que as capitanias, mesmo as subordinadas, seriam transformadas em províncias, foi bom para Santa Catarina, pois a equiparava às demais unidades políticas, ainda que com um território bastante minúsculo se comparado ao atual, envolvendo as vilas de Desterro (capital), Laguna, São Francisco do Sul e Lages.

No ano de 1822, os decretos de Dom Pedro com o objetivo de fortalecer sua autoridade, como o Dia do Fico, e a convocação de uma Assembleia Constituinte, foram bem recebidos pelos catarinenses. A Junta de Governo, prevista pelas Cortes, só foi eleita em maio de 1822, bem depois do que era previsto, por uma manobra do agora governador Tomaz Joaquim Pereira Valente.

A sintonia política da província com o Rio de Janeiro não significa dizer que suas autoridades tivessem plena compreensão da profundidade dos acontecimentos. A ideia de independência como ruptura política dos dois reinos, ao que parece, não fazia parte do horizonte político dos habitantes locais. Talvez defendessem a ideia de dois governos separados, mas um único Império Português, comandando pelo rei Dom João.

A notícia da independência em Santa Catarina foi formalizada em 1º de outubro de 1822, quando chegou a notícia que seria feita a aclamação de Dom Pedro como imperador do Brasil no dia 12 de outubro, o que foi feito, sem sobressaltos. Junto às celebrações e certo entusiasmo político, havia também apreensão e temor de que uma esquadra portuguesa pudesse desembarcar a qualquer momento e restabelecer o domínio lusitano, o que não aconteceu. E assim, Santa Catarina se tornou parte do Império do Brasil.

Rio de Janeiro

 

A cidade do Rio de Janeiro se transformou com a chegada da Corte, em 1808. Novos prédios foram construídos, novas instituições foram criadas e um aumento populacional muito grande aconteceu. No entorno da cidade, no que hoje chamamos de Baixada Fluminense, os antigos canaviais se transformaram em fazendas de produção de gêneros alimentícios, transportados pela Baía de Guanabara até a cidade.

No entanto, a província agregava um território muito maior. Na época pré-independência, destacava-se a plantação de cana de açúcar na região de Campos dos Goytacazes, e do café, no Vale do Paraíba, ambos com grande uso de mão de obra escravizada.

Em termos políticos, com exceção de Campos, cuja elite debateu em certo momento o interesse em apoiar as Cortes de Lisboa, em 1821, não há pesquisas específicas sobre as posições das Câmaras municipais sobre o apoio a Dom Pedro, mas tudo indica que as elites locais recusaram as propostas das Cortes e festejaram a permanência de Dom Pedro no Brasil e sua coroação.

Já na capital, a chapa esquentou com as notícias da Revolução do Porto. Em 26 de fevereiro de 1821, um levante da tropa provocou o juramento das bases da Constituição. No dia 7 de março, Dom João anunciou seu retorno a Portugal e a eleição dos deputados fluminenses às Cortes. A eleição, em 21 de abril, que deveria ser para um público restrito, no prédio da Praça de Comércio, logo tornou-se popular, com a presença de uma multidão. No meio da eleição, irromperam gritos solicitando a adoção da Constituição Espanhola, vista como uma referência, até que a portuguesa ficasse pronta. Um grupo de cinco pessoas foi até o rei, no Palácio de São Cristóvão, entregar um abaixo-assinado com quase 500 assinaturas, solicitando essa adoção, além da nomeação de um conselho para assessorar Dom Pedro, que ficaria no Brasil como príncipe regente. O rei aceitou a primeira exigência e prometeu pensar na segunda.

No entanto, os ânimos se exaltaram na Praça do Comércio, com boatos de que tropas iriam atacar o local e que o grupo de cinco pessoas teria sido detido. Apenas à meia-noite o quinteto retornou do Palácio e o clima se acalmou. Contudo, os manifestantes resolveram eleger uma Junta de Governo, além dos deputados às Cortes, processo que terminou às 4 horas da manhã. Diante do prolongamento, tropas lideradas pelo comandante português Jorge Avilez cercaram a Praça do Comércio às 5 horas, e atacaram a tiros e baionetas quem estava por lá. O número de mortos é incerto (de um a trinta), e o número de feridos, também. Pela manhã, Dom João anulou a adoção da Constituição Espanhola e emitiu um decreto estabelecendo os poderes do príncipe, sem o conselho.

Avilez, nos meses seguintes, entraria em choque com Dom Pedro, pois acreditava que a sua tropa deveria ser tutora do príncipe. Em julho, exigiu que ele jurasse as bases da Constituição e nomeasse uma Junta de Governo. Em outubro, mobilizou suas tropas para que fossem cumpridas as ordens vindas de Lisboa.

Em 9 de janeiro de 1822, Dom Pedro declara que permaneceria no Brasil, mesmo após as Cortes solicitarem seu retorno (Dia do Fico). No dia 11, Avilez reúne dois mil soldados no Morro do Castelo e organiza um movimento com o objetivo de depor Dom Pedro, anular seus poderes e exigir sua fidelidade a Portugal. Houve quebra-quebra e tumulto generalizado entre apoiadores dos lusitanos e da independência. Durante as negociações, Avilez transfere a tropa para Niterói, onde permaneceu buscando reforços. Porém, são cercados e depois de alguns dias, se rendem e retornam a Portugal. Sem uma força militar no seu encalço, Dom Pedro estava livre para se dedicar a costurar as alianças que selariam a independência do Brasil, na qual o Rio de Janeiro teria um papel central, e, posteriormente, capital do Império.

São Paulo

 

O século que antecedeu à independência em São Paulo foi de grande crescimento populacional e produtivo, relacionado ao fornecimento de gêneros de subsistência para as Minas Gerais. Além disso, a lavoura de açúcar ocupou papel importante na economia paulista. Esse processo foi acentuado com a chegada da Corte portuguesa ao Rio de Janeiro, em 1808, e com o início da produção de café no Vale do Paraíba.

A Revolução do Porto instaurou Juntas de Governo nas províncias, com o objetivo de limitar o poder do rei. A primeira Junta em São Paulo foi aclamada em 23 de junho de 1821, sendo presidida pelo último governador, João Carlos Augusto de Oyenhausen. Seu vice-presidente era José Bonifácio de Andrada e Silva; e o secretário do Interior era Martim Francisco Ribeiro de Andrada, além de outros cargos. Seus membros tinham destaque entre grupos de produtores e negociantes, e a maioria se envolveu na política imperial após a independência. Seus membros reunidos nunca se mostraram hostis ao governo de Dom Pedro, mas pretendiam agir com autonomia, mantendo liberdades que tinham anteriormente e, inclusive, discutir atos do príncipe.

Porém, a Junta paulista nunca foi soberana na província. Em maio de 1822, ocorreu um movimento que ficou conhecido como “Bernarda de Francisco Inácio”, que opôs o grupo liderado por Martim Andrada e o grupo liderado por Francisco Inácio de Sousa Queiros. Esses conflitos teriam ensejado a movimentação de parte da tropa, culminando na expulsão de Martim da Junta em 23 de maio de 1822. Constantes confrontos entre autoridades estabelecidas na cidade de São Paulo e nas vilas de Santos e Itu, inclusive a insubordinação das tropas instaladas em Santos em 1821 e a tentativa da Câmara de Itu de formar uma Junta de Governo própria em 1822, indicam a dificuldade na manutenção da união entre grupos de interesse das diversas localidades.

Durante os meses que precederam o Grito do Ipiranga se estabeleceu um complexo processo de acordos e alianças entre Dom Pedro e grupos de poder fluminenses, mineiros e paulistas, para que estes reconhecessem o Rio de Janeiro como centro político e administrativo. O apoio a Dom Pedro não era consensual e foi conquistado gradativamente através de garantias dadas às redes familiares e de negócios destas províncias para que pudessem continuar com suas operações mercantis e influência política com segurança e lucratividade.

A primeira Junta de Governo paulista atuou até agosto de 1822, quando foi dissolvida pessoalmente por Dom Pedro. Em seu lugar, o príncipe instituiu uma junta provisória, liderada pelo bispo Dom Mateus de Abreu Pereira, que atuou até janeiro de 1823. É nesse contexto que Dom Pedro estava quando recebeu notícias da Princesa Leopoldina, de que as Cortes ordenavam seu retorno a Portugal. E é ali que proclama o Grito do Ipiranga, em 7 de setembro de 1822, marco simbólico da independência brasileira.

Minas Gerais

 

A historiografia defende o papel central de Minas Gerais na articulação e sustentação do projeto político de um Império do Brasil. Era a província mais populosa do Brasil, com aproximadamente 500 mil habitantes, sendo destes, cerca de 175 mil escravizados. A sua economia era baseada na produção para o abastecimento do Rio de Janeiro, capital da América Portuguesa.

As notícias da Revolução do Porto rapidamente encontraram eco na província. Entre 1821 e 1822 ocorreram, em diferentes locais da província, como Minas Novas, Vila do Príncipe e Paracatu, sublevações e movimentos protagonizados pelas então chamadas “classes ínfimas”, inclusive os temidos “ajuntamentos de negros” que defendiam vozes de liberdade.

O período da independência também é marcado por uma série de tensões no seio das elites, por conta das formas de representação e da construção dos novos espaços de poder. Inicialmente, quando as notícias das Cortes de Lisboa chegam, o governador Manoel de Portugal e Castro jura as bases da Constituição. Por isso, acreditava que tinha legitimidade para permanecer no cargo, sem a eleição de uma Junta. Porém, parte da elite defendia a eleição de uma Junta, tal como acontecia em outras partes do Brasil.

No final de setembro de 1821, é realizada a eleição para a Junta. A composição dela demonstra a falta de unidade entre os diversos grupos políticos na província. O próprio governador Manoel foi eleito presidente. Os enfrentamentos que se seguiram à instalação da Junta, que envolveram acusações de espionagem e tentativas de assassinato, resultaram no pedido de demissão de Manoel.

Um novo ponto de tensão ocorreu com a chegada dos decretos vindos de Lisboa tratando sobre a nova organização dos governos provinciais. A junta mineira declarou-se incapaz de fazer cumprir estes decretos. Além disso, parte dos deputados mineiros eleitos às Cortes, ao invés de embarcar para Lisboa, permaneceu no Rio de Janeiro e declarou publicamente seu apoio a Dom Pedro. Foi chave nessa declaração o vice-presidente da Junta mineira e deputado, José Teixeira da Fonseca Vasconcellos. Dessa forma, se verifica o rompimento entre a Junta de Governo, sediada em Vila Rica, e parte dos deputados eleitos.

Outro foco de tensão se deu dentro das próprias Câmaras de Vereadores. Várias delas apoiaram diretamente a permanência de Dom Pedro no Brasil, e algumas delas inclusive adotaram posturas contrárias a da Junta de Governo, não reconhecendo sua legitimidade pra falar em nome da população.

Foi diante desse quadro de tensões que Dom Pedro realizou uma viagem pela província, entre março e abril de 1822. Reafirmando seu amor à causa do Brasil, recebeu festejos nas vilas ao sul da província pelas quais passou (Barbacena, São João del Rei, São José del Rei e Queluz), mas tal acolhimento não aconteceu na capital, Vila Rica. Ali, ele só adentrou apenas após negociações e uma ameaça velada de uso da força armada. A seguir, a Junta de Governo foi dissolvida e uma nova eleição foi convocada. A viagem de Dom Pedro teve sucesso ao construir um relativo consenso em relação à adesão de Minas Gerais ao governo do Rio de Janeiro e o rompimento com Portugal.

Bahia

 

Tirando o Rio de Janeiro, a Bahia era a peça mais importante do Império Português na América. E, por isso, foi tão disputada. Um amplo comércio de fumo, açúcar, escravizados, tanto interno quanto externo, aquecia os mercados da capital. Calcula-se que em 1780 havia cerca de 220 mil habitantes na Bahia, dois terços deles em Salvador e seus arredores, o Recôncavo Baiano.

O movimento de adesão às Cortes iniciou no dia 10 de fevereiro de 1821, com a instalação da Junta de Governo. O ano de 1821 ocorreu com certa tranquilidade, destacando-se pela ampla circulação de panfletos e jornais, nos quais se destacavam Idade d´Ouro do Brasil, Sentinela Bahiense e Semanário Cívico, os quais difundiam a teoria política liberal. Em 3 de setembro são eleitos os deputados para as Cortes. Nada apontava para uma separação entre Brasil e Portugal

Em 1822, a situação mudou. Em fevereiro, uma nova Junta de Governo é eleita, com base nas orientações das Cortes. E o comando militar da Bahia é entregue a um militar português, Inácio Luís Madeira de Mello. A decisão vinda de Lisboa descontentou militares e civis, gerando conflitos armados em Salvador entre os dias 18 e 21 de fevereiro. Duzentas a trezentas pessoas morreram. Muitos deixam a capital e se instalam no entorno, na região do Recôncavo, onde estavam as principais fazendas.

Entre os meses de fevereiro e maio a resistência aos militares que ocupavam Salvador se deu de forma passiva. A partir de junho iniciam-se os combates entre as tropas portuguesas e o Exército Libertador, uma força militar organizada no Recôncavo. Várias das Câmaras de Vereadores da Bahia aclamaram Dom Pedro como defensor perpétuo do Brasil. O conflito passou a ser aberto. No dia 21 de agosto, é instalado um governo paralelo, com sede na cidade de Cachoeira, e que apoiava abertamente a causa da independência.

Em algumas vilas foram registrados episódios violentos de perseguição e morte de portugueses, conhecido como mata-marotos. Vilas do interior, como Caetité e Rio de Contas, no oeste e longe de Salvador, instalaram suas próprias Juntas, não acatando as ordens vindas de Cachoeira. Escravizados eram recrutados para lutar no exército, para engrossar o número de soldados. Indígenas eram alistados, com destaque pata o chefe das tropas de índios flecheiros, Bartholomeu “Jacaré”. A efervescência política e social era enorme.

Em novembro, ocorre o principal conflito da independência na Bahia, a Batalha do Pirajá, nos arredores de Salvador. A vitória das tropas baianas consolida a sua posição no cerco à cidade. Com o tempo, reforços chegam, incluindo alguns enviados por Dom Pedro, liderados pelo general Pedro Labatut. Labatut teve sérias divergências com os membros do governo da Cachoeira e foi acusado de autoritarismo. Em maio, ele é removido do comando do Exército Libertador. Em abril, o almirante Thomas Cochrane chega com uma esquadra que bloqueia a Baía de Todos os Santos. Acuados e sem acesso a mantimentos, tanto por terra como por mar, as tropas portuguesas se rendem no dia 1º de julho de 1823, e deixam Salvador no dia seguinte. Esse dia, atualmente, é o feriado estadual na Bahia. Consolidava-se a adesão da Bahia ao Império Brasileiro.

Pernambuco

 

Pernambuco era uma das regiões mais importantes do Império Português. Nas primeiras duas décadas do século XIX, viveu um renascimento do açúcar, e um boom nas plantações de algodão, exportado para a Inglaterra. Todas essas plantações com mão de obra escravizada. Calcula-se que Pernambuco na época da independência tinha cerca de 480 mil habitantes, destes, 130 mil eram escravizados. Politicamente, contudo, as ideias liberais radicais afloravam. A revolta com os impostos por conta da presença da família real no Brasil, somado aos efeitos da seca de 1814 a 1817, levaram a uma rebelião em 1817, que governou a província de forma autônoma e republicana por 74 dias.

A repressão à rebelião de 1817 foi brutal, com diversos fuzilamentos, incluindo padres, o que era incomum no Império Português. Os que permaneceram presos acabaram sendo soltos com a Revolução do Porto. Estes voltam a Pernambuco e se juntam a setores sociais insatisfeitos, formando uma Junta de Governo paralela, sediada na cidade de Goiana, e que se opunha ao Conselho de Governo oficial, sediado no Recife, liderado pelo governador Luís do Rego Barreto.

Após tensões e uma tentativa de atentado contra si, Barreto renuncia e é eleita uma Junta de Governo em outubro de 1821, a qual será presidida por Gervásio Pires Ferreira, um dos líderes de 1817. A Junta não apoiava Dom Pedro, mas também não deixou tropas portuguesas enviadas pelas Cortes de Lisboa desembarcarem no Recife.

Dom Pedro envia emissários para articular a oposição a essa Junta. Congregando militares, proprietários de terras que temiam revoltas de escravizados e magistrados, a oposição derruba a Junta em setembro de 1822. A nova Junta, que ficará conhecida como “Junta dos Matutos” e que incluiria nomes importantes na política brasileira do século XIX, como os irmãos Cavalcanti e Araújo Lima, era alinhada com o Rio de Janeiro.

A independência estava garantida em Pernambuco, mas não sem sobressaltos, como o levante de oficiais e soldados pardos em fevereiro de 1823, conhecido como “Pedrosada”, por conta de seu líder, Pedro Pedroso, um oficial que auxiliou na derrubada de Pires Ferreira, mas não foi recompensado por isso. E, em 1824, a Confederação do Equador, cuja repressão violenta por parte do governo imperial garante definitivamente a presença de Pernambuco (e do Nordeste, como um todo) no Império Brasileiro.

Ceará

 

No início do século XIX, o Ceará era economica e politicamente periférico se comparado a outras regiões da América Portuguesa. Politicamente, recém tinha conquistado sua autonomia, separando-se de Pernambuco em 1799. Economicamente, a sua base era na lavoura de mandioca e de algodão.

Os conflitos políticos na província começaram com as notícias que chegaram de Lisboa, no começo de 1821. É nesse contexto que cresce o antilusitanismo, tanto entre as elites quanto entre os grupos populares. A notícia de que diversas províncias estavam criando Juntas de Governo leva as autoridades políticas e militares do Ceará a pressionarem o então governador Francisco Alberto Rubim a jurar as bases da Constituição. A pressão também tinha um fundo de insatisfação com medidas tomadas por Rubim que limitavam o acesso à mão de obra indígena e outras que limitavam o poder das elites econômicas locais. Em 14 de abril, Rubim jura a Constituição, mas não ordena a eleição de uma Junta.

Em 31 de julho formou-se a primeira Junta de Governo, mas que teve vida curta, por conta de tumultos no interior da província. Figuras como o capitão José Pereira Filgueiras e o coronel Leandro Bezerra Monteiro, apoiados por grandes contingentes de cabras e mulatos, se posicionavam contra a Constituição e a Junta. No vale do Cariri, grupos armados interrompiam missas falando que a Constituição era “lei do diabo”.

Em 3 de novembro, Rubim é deposto e é eleita uma nova Junta, a qual é sucedida por outra, em fevereiro, composta por portugueses simpáticos ao liberalismo de Lisboa. O ano de 1822 é marcado por motins defensores do rei no interior e contra as Cortes: no Cariri, em Aracati, em Russas, em Ibiapina, em Maranguape, as quais são violentamente reprimidas pelo governo de Fortaleza. Em 16 de outubro, a Câmara de Icó estabelece um Governo Temporário, separado de Fortaleza, e liderado por Filgueiras. Temendo consequências da atitude de Icó, a Junta de Governo adere à independência do Brasil em 24 de novembro. A adesão das lideranças do Ceará ao projeto de separação vindo do Rio de Janeiro foi muito mais um resultado de conflitos pessoais e entre as famílias das diferentes regiões da província do que associações espontâneas a agentes externos ou manifestações de fidelidade ideológica ou identitária.

Mesmo com a adesão a independência, a Junta de Governo não aguentou a pressão vinda do interior, e Filgueiras, com cerca de dois mil homens, entrou em Fortaleza em 23 de janeiro de 1823. Era a vitória do sertão da província sobre os comerciantes do litoral, que eram mais ligados a Lisboa que ao Rio de Janeiro. Em seguida, o governo da província organiza o envio de tropas para o Piauí, para defender os adeptos da independência. Elas participam da importante Batalha do Jenipapo e de batalhas no Piauí e no Maranhão, contribuindo para a adesão dessas duas províncias ao nascente Império do Brasil.