Texto adaptado de: https://revistaforum.com.br/direitos/2014/12/3/as-10-mentiras-mais-contadas-sobre-os-indigenas-10984.html
Original em 03-12-2014. Acesso em 07-04-2024
As afirmações listadas abaixo foram extraídas da vida real. Algumas nas
ruas do interior do Brasil, outras nas cidades grandes, outras em discursos de
políticos. Percepções diversas, vindas de pessoas com histórias diferentes, mas
com um direcionamento em comum: a disseminação do discurso anti-indígena com
argumentos falsos.
Texto por Lilian Brandt.
Mentira nº 1: Quase não existe mais índio, daqui alguns anos não
existirá mais nenhum
Se as pessoas não sabem muito sobre os indígenas na atualidade, sabem
menos ainda sobre o passado destes povos. Mesmo os pesquisadores não encontram
um consenso, e os números variam muito conforme os critérios utilizados.
A antropóloga e demógrafa Marta Maria Azevedo estima que, na época da
chegada dos europeus, a população indígena no Brasil era de 3 milhões de
pessoas, em mais de 1.000 povos. De acordo com antropóloga, em 1957 havia no
Brasil apenas 70 mil indígenas. O crescimento desta população é observado
somente a partir da década de 1980.
Em 1991, quando o IBGE passou a coletar dados sobre a população indígena
brasileira, eles somavam 294 mil pessoas. Em 2000, o Censo revelou um
crescimento da população indígena muito acima da expectativa, passando para 734
mil pessoas. Em 2010, a população indígena continuou crescendo, e o Censo
mostrou que mais de 817 mil brasileiros se autodeclararam indígenas,
representando 0,47% da população brasileira. Eles estão distribuídos em 305
etnias e falam 274 línguas.
Esse aumento populacional jamais seria possível se fossem considerados
apenas fatores demográficos, como a natalidade e a mortalidade. Esses dados
revelam o crescimento do número de pessoas que passaram a se reconhecer como
indígenas e o “ressurgimento” de grupos indígenas. Isto se dá porque, antes,
ser índio no Brasil significava ser atrasado, inferior, escravizado,
catequizado, ser alvo de discriminação, de chacinas e até mesmo não ser
considerado humano. Diversos povos foram obrigados a abrir mão de suas línguas
e de sua cultura. Agora os povos indígenas voltam a afirmar sua identidade,
talvez porque as circunstâncias estejam mais amigáveis. Ou talvez porque este
grito não suporte mais ser calado.
Os indígenas que vivem em áreas urbanas somam 324 mil, ou seja, 36% do
total da população indígena, um número que vem crescendo ano após ano (IBGE,
2010). Há dois motivos recorrentes para que esses índios vivam em áreas
urbanas. Um deles é a migração dos territórios tradicionais em busca de
melhores condições de vida na cidade. O outro é que os limites das cidades cada
vez mais alcançam as fronteiras de seus territórios.
Mentira nº 2: Os índios estão perdendo sua cultura
Esta afirmação resume uma série de outras ideias muito difundidas:
“índio que usa celular não é mais índio”, e suas variáveis televisão,
computador, calça jeans, tênis, rede de pesca, barco a motor, caminhonete,
trator e etc.
De modo geral, cultura é o conjunto de manifestações que inclui o
conhecimento, a arte, as crenças, a língua, a moral, os costumes, os
comportamentos e todos os hábitos e aptidões adquiridos por pessoas que fazem
parte de uma sociedade específica.
Sendo composta por diversos elementos, a cultura está em constante
transformação, se inter-relacionando de diferentes formas com o ambiente, as
circunstâncias, outras culturas e consigo mesma. Logo, a cultura não é algo que
se perde, é algo que se transforma constantemente. [...]
Neste sentido, a incorporação de elementos de outra cultura é também uma
estratégia de resistência. O uso de equipamentos de pesca dos “brancos”, por
exemplo, pode ser um modo de resistência cultural, num entendimento de que
pescar é mais importante para a identidade indígena do que se manter preso a
técnicas tradicionais e não chegar com o peixe em casa.
Outras vezes, objetos não-indígenas podem ser inseridos na cultura
indígena com um significado e uso completamente diferentes do nosso, como
garrafas plásticas cuidadosamente cortadas e limadas para fazerem colares, à
semelhança do que fazem há centenas de anos com as lascas de caramujos. E
outras vezes, por fim, eles podem incorporar determinado elemento de outra
cultura e nem por isso serem “menos índios”, assim como comer sushi não nos
torna japoneses, tomar chimarrão não nos torna gaúchos e tomar banhos diários
não nos torna índios. [...]
Mentira nº 3: Estão inventando índios, agora todo mundo pode ser índio
Se a pessoa se reconhece como indígena e se identifica com um grupo de
pessoas que também se reconhecem como indígenas e a consideram indígena, então
ela é. Não existe nenhum reconhecimento da Funai, nenhum julgamento de um
não-indígena e nenhum critério imposto por nossa sociedade que possa ser maior
do que o seu sentimento e o sentimento da coletividade a qual ela pertença.
Ela pode se considerar indígena por uma questão genética e/ou cultural,
mas não cabe a nós e nem ao governo atribuir identidade a outra pessoa. A
autodeclaração é defendida também pela Convenção nº 169 sobre Povos Indígenas e
Tribais da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil
em 2000.
Por isso, não tem fundamento a ideia de que “sendo assim, todos os
brasileiros seriam indígenas, já que correm em nossas veias sangue indígena,
daquela bisavó que foi pega no laço”. Este discurso não viria de um indígena.
Se o cidadão diz isso querendo reduzir o direito de ser índio na atualidade, é
evidente que está se identificando muito mais com o bisavô estuprador do que
com a bisavó violentada. [...]
Mentira nº 4: O Brasil é um país miscigenado, aqui não tem racismo
Racismo, assim como machismo, é algo sutil. Às vezes ele aparece
escancarado, quando um sujeito chama um negro de “macaco”, quando uma mulher é
estuprada, quando se constata um salário menor para mulheres e negros do que
para homens brancos para fazerem exatamente o mesmo trabalho. Esse racismo
escancarado é muitas vezes (mas nem sempre) condenado pela sociedade.
Há infinitas combinações de cores, há infinitas formas de demonstrar e
de esconder o racismo e ainda assim julgar-se superior. Com indígenas é pior,
porque a diferença não está só na cor da pele, no tipo de cabelo e na classe
social. Além de tudo isso, a diferença é cultural e muitas vezes até
linguística. Os indígenas são os brasileiros mais ímpares e diferentes que
compartilham o mesmo território que nós.
O racismo pode aparecer em momentos leves, entre amigos. As pessoas
naturalizaram de uma tal forma o racismo contra indígenas, que não percebem que
jamais poderiam usar aquelas mesmas palavras para se referir a qualquer outro
grupo de pessoas. [...]
Um dos modos que o racismo age é pela generalização, quando se nota algo
negativo de um indivíduo e se transfere essa questão ofensiva para o povo todo.
Utilizando um exemplo bem comum em cidades pequenas que convivem com indígenas,
imagine que alguém veja na rua um homem bêbado. Se o homem não é indígena,
comenta-se “este homem está bêbado”, mas se ele for indígena o comentário é “os
índios estão sempre bêbados”.
Mentira nº 5: Os índios têm muitos privilégios
Se estivéssemos aqui falando de privilégios como desfrutar de uma vida
em meio à natureza, estaria tudo bem. Mas não, infelizmente este discurso vem
acompanhado da crença de que “índio recebe um salário do governo a partir do
momento que nasce”.
Pior do que ter tantas pessoas acreditando nisso, é a surpresa que
expressam quando descobrem que não. “Não? Mas então, do que vivem?”. Parece
impossível acreditar que trabalham e que batalham pelo seu sustento. Ao
contrário do que tantos brasileiros acreditam, não existe muita vantagem em ser
indígena hoje em dia. Existe sim, muita coragem.
Em relação à saúde, a diferença é que os indígenas são atendidos pela
Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena), que é parte do mesmo SUS que
atende aos não-indígenas. Na teoria, essa distinção permite um olhar
diferenciado dos profissionais de saúde, considerando questões culturais e
atuando em consonância com as práticas de saúde tradicionais indígenas. Na
prática, como os nossos postos de saúde, alguns funcionam bem, outros não.
Faltam equipamentos, às vezes não têm remédios, faltam profissionais especializados,
etc. Falta percorrer um longo caminho.
Na área da educação por muitos anos os indígenas estiveram expostos à
imposição de nossos valores e negação de sua identidade e cultura. Hoje o
Ministério da Educação é responsável por desenvolver uma educação diferenciada,
intercultural e bilíngue, dando espaço aos processos de aprendizagem e aos
conhecimentos indígenas. Além disso, os indígenas podem elaborar seus próprios
currículos e rotinas escolares com gestão indígena. Na prática, como no ensino
público para não-indígenas, com exceção de alguns casos de sucesso, faltam
materiais didáticos específicos, alimentação (sendo que poucas vezes esta é de
fato diferenciada), infra-estrutura etc.
Quanto aos benefícios sociais, indígenas são considerados pelo INSS
“segurados especiais” para fins de acesso ao salário maternidade, aposentadoria
por idade, auxílio doença, auxílio acidente, aposentadoria por invalidez,
pensão por morte e auxílio reclusão.
Segurados especiais são os trabalhadores rurais que produzem em regime
de economia familiar, sem utilização de mão de obra assalariada. Além dos
indígenas, são considerados segurados especiais os agricultores, os
seringueiros e os pescadores artesanais. Os indígenas precisam comprovar que
sua subsistência advém do extrativismo, do plantio ou de outra atividade
vinculada à terra e aos recursos naturais. Ou seja, os indígenas acessam estes
benefícios não por serem indígenas, mas sim por viverem de atividades rurais,
pois se forem assalariados, deixam de ser segurados especiais.
E, por fim, os indígenas possuem o direito de usufruir de seu
território. As Terras Indígenas não são dos indígenas, são propriedade da
União, terras públicas que pertencem a toda a nação brasileira, cedidas aos
índios em regime de posse permanente e usufruto exclusivo. Ou seja, eles não
têm a propriedade das terras: ganham o direito de nelas residir e fazer uso das
riquezas do solo e das águas para a atual e as futuras gerações viverem.
Mentira nº 6: Os índios são tutelados, por isso índio não vai preso
Essa história é antiga e tem um fundo de verdade. Desde o período
colonial até o século passado, o Estado sempre considerou que os indígenas
deveriam ser integrados, ou seja, deveriam negar suas identidades em nome de
sua inserção à nação brasileira.
O Estatuto do Índio (Lei n. 6.001/73) endossou o regime de tutela,
depois de separar categorias de índios em “isolados”, em “vias de integração” e
“integrados”, estabelecendo que o regime tutelar se aplicaria aos índios ainda
não integrados.
A legislação só tomou um rumo diferente em 1988, com a atual
Constituição Federal Brasileira. Nossa Constituição reconheceu e introduziu os
direitos permanentes dos índios, abandonando a ideia de que eles seriam
assimilados à nossa sociedade e endossando a ideia de que os índios são
sujeitos presentes e capazes de permanecer no futuro. Ela reconheceu ainda o
direito dos indígenas às suas terras e à cidadania plena. Esse avanço na
legislação indigenista foi uma conquista do movimento indígena.
Em relação à criminalização, o Estatuto do Índio diz que a pena deve ser
atenuada, e “se possível, em regime especial de semiliberdade, no local de
funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da
habitação do condenado” (Art. 56).
A tutela em nada tem a ver com a não-responsabilização do indivíduo por
um crime que praticou. Tem a ver com um julgamento diferenciado caso a questão
se relacione à sua prática cultural e à necessidade de um intérprete em seu
interrogatório, caso o indígena não tenha completo domínio da língua
portuguesa.
Em relação aos delitos, a lei para os indígenas é a mesma que a nossa.
Índios podem ser e são presos quando roubam, quando praticam atos de violência,
cometem assassinatos e por todos os motivos que os não-indígenas são presos.
Mentira nº 7: Tem muita terra para pouco índio
Em 1973, o Estatuto do Índio ordenou ao Estado brasileiro a demarcação
de todas as terras indígenas até dezembro de 1978. Depois de dez anos, a
Constituição Brasileira reconheceu aos índios os “direitos originários sobre as
terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e
fazer respeitar todos os seus bens” (Art. 231), e estabeleceu o prazo de cinco
anos para a demarcação de todas as Terras Indígenas.
Quando a Constituição traz o termo “direitos originários”, ela revela
que este direito vem desde sempre, antecedendo à própria Constituição. As
demarcações são apenas reconhecimento desse direito pré-existente. A noção de
território não constitui apenas uma relação de ocupação ou exploração, mas o
fundamento da existência do povo, pois somente em seu território é possível a
prática plena de sua cultura.
No entanto, até hoje o Estado se recusa a cumprir sua obrigação e a cada
dia crescem mais os interesses econômicos sobre estas terras tradicionais. Não
bastasse isso, muitas Terras Indígenas são cada vez mais diretamente ou
indiretamente afetadas por grandes empreendimentos, monoculturas com uso
abusivo de agrotóxicos, mineradoras etc.
Enquanto os agentes destes grandes poderes econômicos tentam barrar
todos os processos de demarcações, também dizem que é preciso modificar o
procedimento de demarcação. O Decreto
1.775/1996 detalha todo o procedimento, havendo um grupo técnico
especializado, coordenado por antropólogo, com a finalidade de realizar estudos
complementares de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica,
ambiental e o levantamento fundiário necessários à delimitação. Após passar por
autorização da Funai, é aberto um prazo para contestações e somente depois é
feita a demarcação.
Os ocupantes não-indígenas são indenizados tanto pelas benfeitorias
quanto pelos títulos de propriedade de boa fé. Além disso, os ocupantes
não-índios que atendem ao perfil da reforma agrária são reassentados, a cargo
do Incra.
As Terras Indígenas são inalienáveis e indisponíveis, ou seja, os
indígenas não podem efetuar nenhum negócio jurídico que acarrete a
transferência da titularidade de direitos sobre estas terras, e nem mesmo
permitir o beneficiamento de não-indígenas com a exploração dos recursos
naturais, pois o usufruto é exclusivos dos indígenas.
O discurso anti-indígena tem como principal argumento que as Terras
Indígenas ocupam 13% do território nacional. Mas os brasileiros não se dão
conta da imensa área que os latifúndios ocupam. O Brasil tem uma área de mais
de 851 milhões de hectares. Destes, mais de 318 milhões são ocupados por
grandes propriedades, totalizando 37% do território nacional. [...]
Os indígenas ocupam uma área de 106 milhões de hectares, sendo mais de
567 mil pessoas. Ou seja, os indígenas estão em um território quase 3 vezes
menor que o território das grandes propriedades, apesar de ser quase 4 vezes
mais populoso. E repare que não estão sendo contados aqui os indígenas que
vivem nas cidades, somente os que vivem em Terras Indígenas. Seria preciso
multiplicar em 37 vezes o número de proprietários no latifúndio para ele se
equivaler à área por pessoa em Terra Indígena. Portanto, nota-se: temos no
Brasil muita terra para poucos proprietários.
A maior parte das terras indígenas está na Amazônia Legal, onde vive
cerca de 55% da população indígena no Brasil. Nas demais regiões do país,
principalmente nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul, além do estado do Mato
Grosso do Sul, os povos indígenas conseguiram manter a posse em áreas
geralmente diminutas e esparsas, espremidos entre cidades e fazendas, sem as
condições mínimas necessárias para manter seu modo de vida. É justamente nessas
regiões que se verifica atualmente a maior ocorrência de conflitos fundiários e
disputas pela terra.
Mentira nº 8: Os índios são preguiçosos e não gostam de trabalhar
Cá entre nós, poucas pessoas verdadeiramente gostam muito de trabalhar.
A maioria trabalha porque precisa do dinheiro para pagar as contas, para
comprar comida, para comprar o celular e para comprar sempre e cada vez mais
tudo que possa surgir. Essa é a lógica das sociedades capitalistas: ter cada
vez mais, acumular e nunca estar satisfeito com o que tem.
A lógica indígena, tradicionalmente, não se interessa em acumular, e sim
em desfrutar. Portanto, se antes do sol chegar ao alto do céu, o homem já
pescou peixe para a família toda se alimentar naquele dia, ele pode voltar para
casa e descansar, pois sua obrigação já foi cumprida.
Mas espera aí… caçar, pescar, plantar, colher, manejar, construir sua
casa, fazer seu barco e fazer tudo mais que uma vida auto-subsistente necessita
não parece nada fácil. Imagine então que para realizar cada uma destas tarefas
é preciso muitas outras. Para fazer o barco, por exemplo, é preciso entrar no
mato, encontrar uma árvore de uma espécie específica que esteja num bom tamanho
e formato, derrubar a árvore, tirar da floresta, cortar e moldar a madeira,
queimar de um modo específico com uma lenha específica, moldar novamente como o
avô ensinou, queimar de novo, e pronto, finalmente ele tem o barco para pescar,
resumidamente. Quem se habilita?
Durante séculos os indígenas estiveram domesticando diversas espécies de
plantas que hoje consumimos, como o milho, um dos grãos mais produzidos no
mundo, e a mandioca, que os brasileiros tanto gostam. Estas plantas e tantas
outras, como feijões, abóboras, carás e tomates, não eram encontradas na
natureza como hoje as conhecemos. São o resultado de muito trabalho indígena.
Superando esse preconceito, vamos considerar que os indígenas também têm
o direito de querer comprar coisas que compramos, e, portanto, precisam de
dinheiro. Algumas etnias estão buscando meios de vida que integrem sua cultura
a essa nova necessidade.
Mentira nº 9: Nossa sociedade é mais avançada, não temos nada para
aprender com os índios
Todo mundo sabe que a cultura brasileira tem influência indígena. Com
eles aprendemos diversas palavras, o respeito à natureza e o hábito de tomar
banho todos os dias, certo? No entanto, para cada elogio existe um contraponto:
“índio que fala português não é mais índio”, “antes índio era inocente, agora
índio só pensa em dinheiro” e a pior frase de todas: “índio fede”.
Essa mentira é muito comum: “índio fede”. Não, o que fede é o
preconceito. Índio tem cheiro de óleo de tucum, de urucum e jenipapo, tem
cheiro de fogo feito em casa, de peixe assado, de suor de quem trabalha, de
banho de rio, de sabonete e de perfume comprado em shopping.
Enchemos o peito para dizer que o Brasil é um país lindo, rico em
minérios, com uma biodiversidade impressionante e com muita fartura de água.
Mas seguimos exaurindo os nossos recursos naturais perseguindo um desejo de
crescimento que parece nunca ter fim, como se os recursos naturais fossem
infinitos. Mas saibam, recursos naturais chegam ao fim.
Estamos sacrificando nossa diversidade biológica e cultural para
enriquecer ainda mais quem já é rico. E os índios, que são o símbolo maior de
uma vida sustentável, que são os grandes conhecedores da biodiversidade
brasileira, tão pouco conhecida pelos cientistas, estão sendo desprezados.
Enquanto se desmata incessantemente a Amazônia e o Cerrado, desaparecem
espécies de plantas que poderiam ser utilizadas para tratar inúmeras doenças,
conhecidas ou não. Enquanto se pratica o genocídio e se mantém os indígenas
como reféns do “progresso”, infinitas possibilidades de conhecimento vão
desaparecendo e os brasileiros não se dão conta.
Mentira nº 10: Os índios atrasam o desenvolvimento do País
Mesmo que no mundo todo cada vez mais aumente a preocupação ambiental, o
Brasil continua com a mesma ideologia que balança no centro de nossa bandeira,
nossa palavra de ordem é o progresso.
Um progresso desesperado, que não pode dar o tempo para fazer o estudo
de impacto ambiental, que não pode analisar as possibilidades de redução de
danos, um progresso que chega custe o que custar, e que agora, mais do que
nunca, quer explorar os recursos das Terras Indígenas.
O principal aspecto a ser considerado é que os grandes donos do poder
econômico (os setores bancário, armamentista, minerário, farmacêutico, da
construção civil, do agronegócio etc.) possuem interesse em divulgar uma imagem
negativa dos indígenas. As grandes corporações tomaram conta da arena política
e querem a qualquer custo convencer a nação de que “é preciso crescer e os
índios atrasam o desenvolvimento do País”. Na lógica deles é mais importante
plantar soja para a China do que preservar as nascentes brasileiras.
Os indígenas têm o direito de viverem em seus territórios. Já temos no
país muitas terras para a criação de gado e o plantio de monoculturas,
concentrada nas mãos de poucas pessoas. Desenvolvimento é bom, mas de qualquer
jeito, não. Não podemos admitir um desenvolvimento que desrespeite leis,
culturas e provoque mais desigualdade social.
Os indígenas devem poder escolher se desejam se beneficiar do
desenvolvimento e de que forma, ou se preferem nem se envolver. Mas eles não
podem continuar sendo desrespeitados em nome do interesse econômico.
Não precisamos de um crescimento desrespeitoso, realizado sem estudos de
impacto ambiental, social e cultural. Tampouco necessitamos da malícia de
políticos e da mídia. Precisamos sim tirar a venda dos olhos e enxergar o índio
realmente, pois são mentiras e preconceitos que atrasam a evolução humana.
O desenvolvimento deve ser bom para todos. A paz entre os povos, já
prevista em nossa Constituição Federal, deve ir além da diplomacia e incluir os
que vivem em solo pátrio.
Tenhamos amor!
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